Tenho tanto sentimento
Que é freqüente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.
Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.
Qual porém é a verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar.
Fernando Pessoa
2.9.14
Tenho Tanto Sentimento
5.6.14
22.3.13
1.1.13
30.12.12
Procura-se um Amigo
Procura-se um Amigo
Não precisa ser homem, basta ser humano, basta ter sentimento, basta ter
coração. Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir. Tem que gostar de poesia, de
madrugada, de pássaro, de sol, da lua, do canto dos ventos e das canções da brisa. Deve ter
amor, um grande amor por alguém, ou então sentir falta de não ter esse amor. Deve amar o próximo
e respeitar a dor que os passantes levam consigo. Deve guardar segredo sem se sacrificar.
Não é preciso que seja de primeira mão, nem é imprescindível que seja de
segunda mão. Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. Não é preciso que
seja puro, nem que seja de todo impuro, mas não deve ser vulgar. Deve ter um ideal e medo de
perdê-lo e, no caso de assim não ser, deve sentir o grande vácuo que isso deixa. Tem que ter
ressonâncias humanas, seu principal objetivo deve ser o de amigo. Deve sentir pena das pessoas
tristes e compreender o imenso vazio dos solitários. Deve gostar de crianças e lastimar as que
não puderam nascer.
Procura-se um amigo para gostar dos mesmos gostos, que se comova, quando
chamado de amigo. Que saiba conversar de coisas simples, de orvalhos, de grande chuvas e das
recordações de infância. Precisa-se de um amigo para não se enlouquecer, para contar o que se
viu de belo e triste durante o dia, dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade.
Deve gostar de ruas desertas, de poças de água e de caminhos molhados, de beira de estrada, de
mato depois da chuva, de se deitar no capim.
Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, não porque a vida é
bela, mas porque já se tem um amigo. Precisa-se de um amigo para se parar de chorar. Para não se
viver debruçado no passado em busca de memórias perdidas. Que nos bata nos ombros sorrindo ou
chorando, mas que nos chame de amigo, para ter-se a consciência de que ainda se vive.
Vinicius de Moraes
13.11.12
12.11.12
Assinar:
Postagens (Atom)